11/12/2020

O ensino à distância e o techwashing

São oito meses de pandemia e, portanto, são oito meses de professores inventando novas maneiras de dar aulas e oito meses de alunos tentando não enlouquecer com as aulas online e com a falta da socialização que a escola proporciona. Dependendo da idade dos alunos, pode-se somar ao exército de pessoas tentando se entender com os novos meios por onde a educação está se dando, os pais e as mães de quem são exigidas mais habilidades, entre elas, as de técnicos de informática, professores de digitação e monitores das mais variadas disciplinas.

Verdade seja dita (e nem é uma novidade muito grande, mas uma obviedade do momento), a pandemia pegou todo mundo de surpresa e é possível dizer que, tirando uma ou outra 'alma evoluída' deste mundo, ninguém estava preparado para isso, nem para as implicações e consequência disso. Na Educação, a tendência encontrada em outras áreas também se concretizou. Por mais que EADs já fossem uma realidade no mundo, principalmente no Ensino Superior e em cursos de pós-graduação, os professores da Educação Básica (Ensino Fundamental e Ensino Médio) foram pegos de calças curtas e tiveram que correr para se reinventar. Abaixo, fotografias extraídas de diferentes fontes, mostram algumas das estratégias adotadas pelos professores.


Acessibilidade: Fotografia de um professor vestindo moletom azul e segurando uma régua triangular encostada na lousa de giz em uma sala de aula com diversas cadeiras azuis vazias e um câmera filmando a aula. Crédito: Xinhua/Li Jianan. Publicação de: http://portuguese.xinhuanet.com/2020-02/03/c_138751481_2.htm 


Acessibilidade: Fotografia de uma grande sala de aula, com cadeiras de madeira vazias e um grande painel com muitas telas como de monitores ou televisores onde é possível ver alunos online. No centro do painel uma tela disponível para a apresentação da aula. Crédito: Divulgação da Escola de Negócios e Seguros. Publicação de: 
https://valor.globo.com/carreira/noticia/2020/04/16/escolas-investem-para-inovar-na-educacao-virtual.ghtml

Acessibilidade: Três fotografias de uma professora vestida com um terno preto, cabelos loiros dando aula em uma sala muito moderna com monitores do chão ao teto na Harvard University, uma das universidades mais ricas do mundo. Nos monitores é possível ver os alunos. Na parede oposta aos monitores, uma lousa digital. Em uma das fotografias, a professora faz anotações na lousa digital. Publicação de: https://twitter.com/paygee1/status/1324032846512726022

Acessibilidade: Fotografia de um aluno com livros em frente ao monitor do computador em um ambiente que se parece um quarto. No monitor é possível ver a professora em um ambiente que parece ser doméstico. Crédito: Shutterstock. Publicação de: https://desafiosdaeducacao.grupoa.com.br/ead-alternativa-coronavirus

Bom... olhando as imagens, "reinventar" talvez não seja a palavra ideal. Em todas elas vemos alunos e/ou professores tendo aulas não presenciais. Aulas que saíram do âmbito da sala de aula convencional e que restringiram a convivência física e passaram para um modo digitalizado

Talvez seja preciso aqui fazer uma distinção entre o que está digitalizado e o que está digital. Me refiro a digitalizado quando penso em um sistema, processo, material ou serviço que foi pensado, estruturando e arquitetado para ser um sistema, processo, material ou serviço offline e foi adaptado para virar digital (por exemplo, um livro que foi disponibilizado em pdf ou ebook mas que foi pensado no para o meio impresso ou uma sequência de atividades que foi pensada para ser realizada no caderno mas que agora tem uma interface para o computador ou o tablet e agora possibilitam clicar ou arrastar a resposta, ou uma demonstração experimental que foi pensada para ocorrer em sala de aula e agora virou um vídeo). Me refiro a digital quando penso em um sistema, processo, material ou serviço que foi pensado, estruturado e arquitetado de forma online para ser usado de forma online enfim, que nasceu digital.

A maioria absoluta dos alunos e dos professores que eu acompanhei durante a pandemia mudaram o MEIO no qual a aula estava sendo dada, mas não mudaram, de maneira geral, a FORMA de educar. Alguns, com muito esforço, começaram a pensar em metodologias como sala de aula invertida ou educomunicação, mas foram poucos os que foram além e chegaram a uma aula com abordagem de ensino por investigação ou ensino por projetos. O fato é que é muito difícil para diversos professores abandonarem de vez a ideia de transmissores de conhecimento - embora os alunos, nessas novas estruturas, estejam conectados a maior fonte de informações e conhecimentos de que dispomos atualmente, a internet. É extremamente difícil tornar-se um professor mediador do ensino, disposto a encarar novas estratégias e aprender junto com os alunos maneiras de utilizar o conhecimento disponível no mundo. É, de fato, uma perda de segurança e uma postura um tanto defensiva (não os julgo, não foram formados para pensar e para estruturar uma aula assim).

Por sua vez, os produtores de conteúdo passam por uma fase de difícil transição e ficam entre o digitalizar materiais já existente e produzir materiais digitais inteiramente novos. É comercialmente relevante saber onde investir dinheiro, principalmente em um ano economicamente difícil como 2020, e é preciso entender a demanda das escolas e dos professores.

Essa digitalização de conteúdos e essa falta de criação de produtos pensando em uma Educação Digital verdadeira são espaços para a criação do que estou chamando aqui de 'techwashing'. Por techwashing quero dizer: estamos dando um banho tecnológico em velhos sistemas, processos, materiais e serviços educacionais, mas não estamos inovando nas formas de educar, não estamos criando uma educação digital para possibilitar um verdadeiro ensino à distância. Estamos nos apropriando de ideias tecnológicas para mudar o meio em que as aulas estão sendo dadas, na esperança de que isso crie facilidades ou novas possibilidades para professores e alunos, mas não estamos mudando a forma de interação entre professores e alunos e entre alunos e conteúdos. 

O techwashing certamente vai favorecer os alunos que têm recursos à disposição para terem as velhas aulas e fazerem as velhas atividades, agora no ambiente online. Também vai trazer, fato, algumas "vantagens" como respostas e gabaritos instantâneos ou geração de relatórios de presença e atividades feitas (para pais e professores que gostam de controlar de perto o processo de aprendizagem).  As verdadeiras aulas digitais, utilizando recursos pensados, estruturados e arquitetados com a finalidade de educar de forma digital, desenvolvendo pensamento computacional e científico, essas ainda não encontrei. 

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Todos os endereços eletrônicos citados nesse texto foram acessados em 12 de novembro de 2020.

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